terça-feira, 7 de agosto de 2012

Tião Neto - Sebastião Costa Carvalho Neto

Nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 05 de novembro de l931 e faleceu  em Niterói, em 13 de junho de 2001.

Geralmente quando começo escrever sobre um determinado músico coloco na agulha um de seus discos para ouvir e ver se vem uma inspiração. No momento estou ouvindo The Bossa Três, 1963, Green Dolphin Street. Que coisa linda! Tião Neto, Edison Machado e Vinhas em total harmonia. É uma das músicas que mais gosto nesse disco. Acho que Edison Machado jamais tocou com tanta leveza e suavidade, e Tião Neto, com seu baixo acústico fazendo aquela ponte entre bateria e piano, é demais. E as músicas Só Saudade e Céu e mar? Grande disco. Era a época dos Trios. Todos queriam formar um trio como o de Bill Evans: Scott LaFaro (baixo) e Paul Motion (bateria), um dos mais aclamados trios de todos os tempos. Acho que Os Bossa Três chegaram lá.

Tião Neto, Luiz Carlos Vinhas e Bill Evans
(Livro - Bossa Nova - História Som e Imagem)

Tião Neto conheceu Sérgio Mendes em Niterói na década de 50, no Clube Central de Niterói (RJ), depois caiu no Beco das Garrafas, em Copacabana (RJ). Aí tocou com todo mundo e acompanhou todo mundo. Impressionante, qualquer fotografia da época tem Tião Neto no contrabaixo, e olha que a turma era da pesada, todos arrebentando nas tardes de domingo no Little Clube e no Bottle’s (boates do Beco das Garrafas em Copacabana – RJ): trombone - Raul de Souza (Raulzinho), Edmundo e Edison Maciel, sax – J.T. Meireles, Aurino Ferreira, Paulo Moura, Juarez Araújo, Cipó, Jorginho e Bebeto, trompete – Pedro Paulo e Maurílio, piano – Toninho, Don Salvador, Tenório Jr., Luizinho Eça, Luís Carlos Vinhas, violão – Durval Ferreira, Baden Powell, contrabaixo – Tião Neto, Tião Marinho, Otávio Bailey, Manoel Gusmão, Sérgio Barrozo, bateria – Dom Um Romão, Edison Machado, Victor Manga, Chico Batera, Airton Moreira, Wilson das Neves, João Palma, Hélcio Milito, Milton Banana e por aí vai.

Acompanhou todas as estrelas em início de carreira. Você vai ver essa turma aí formando trios, quartetos, quintetos, sextetos e big-band de acordo com a necessidade. Todos se conheciam e se respeitavam. Qualquer cantor que precisasse de acompanhamento era só pintar no Beco das Garrafas e escolher a formação mais adequada.

Tião Neto, Tenório Jr., Victor Manga, Ronaldo Bôscoli, Cláudio, Giovanni Campana, Hélcio Milito e Luiz Carlos Vinhas
(Livro - Bossa Nova - História Som e Imagem)

Tião Neto não foi um músico que gravou e tocou com todo mundo com Luizão Maia e Sérgio Barrozo, outros dois grandes baixistas do Brasil, sempre esteve ligado a uma banda. No começo da carreira formou Os Bossa Três. Em 1966 tocou nos EUA no Bola Sete Trio, com Bola Sete no violão e Paulinho Da Costa na bateria. O registro desse trio está no disco Bola Sete at the Monterey Festival. Infelizmente muito difícil de achar essa bolacha. Depois tocou muito tempo com Sérgio Mendes.

A partir de 1983, de volta ao Brasil, passa a tocar com Tom Jobim e a Banda Nova. De1990 até 1997 acompanha Nana Caymmi. Em 1995 cria o T.N.T – Tião Neto Trio.

Bola Sete Trio (site oficial de Bola Sete - www.bolasete.com)
Tenório Jr., Tião Neto e Edson Machado

Johnny Alf, Tião Neto e Edson Machado
(Livro - Bossa Nova - História Som e Imagem)

Sua carreira começou no Bottle’s de Alberico Campana, hoje dono da Churrascaria Plataforma, no Leblon, reduto de Tom Jobim quando vivo. Alí nasceu o Bossa Rio, tremenda banda instrumental com um som hard-bossa totalmente selvagem. A banda era formada por Tião Neto, contrabaixo, Raul de Souza (Raulzinho), trombone de válvula, Edson Maciel, trombone de vara, Hector Costita, sax-tenor, Edson Machado, bateria, Aurino Ferreira, sax-tenor e Sérgio Mendes, no piano. Dá para acreditar? Isso deve ter sido alucinante.


Sérgio Mendes, Maciel, Edison Machado e Tião Neto
(Livro - Bossa Nova - História Som e Imagem)

Bossa Rio - Universidade Mackenzie, São Paulo
Juarez, Aurino, Edson Maciel, Victor Manga, Tião Neto e Sérgio Mendes
(Livro - Bossa Nova - História Som e Imagem)

Em 1962 participa do memorável show na boate Au Bom Gourmet, em Copacabana (RJ), que reuniu nada menos que Tom Jobim, Vinícius de Moraes, João Gilberto, Milton Banana e o conjunto Os Cariocas. Nesse palco foram apresentados os sucessos Samba da Benção, Garota de Ipanema, Samba do Avião, Astronauta entre outras.

Em 1962 forma Os Bossa Três e gravam seis discos de imenso sucesso: Os Bossa Três (1962), Bossa Três e Seus Amigos (1962), Bossa Três e Jo Basile (1962), Bossa Três e Lennie Dale (1962), Em Forma (1965) e Bossa Três (1966).

Estou ouvindo agora Blues Walk (The Bossa Três, 1963), a primeira faixa. Que sacode. Demais. Uma aula de contrabaixo para a garotada.

Tião Neto, Luiz Carlos Vinhas, Herbie Man, Kenny Dorhan. Sérgio Mendes só assistindo
(Livro - Bossa Nova -História Som e Imagem)

Ensaio de Lennie Dale com Tião Neto, Luiz Carlos Vinhas e Edison Machado
na boate Fred's

(Livro - Bossa Nova - História Som e Imagem)

Em 1962, Tião Neto, de bobeira em Nova York, é chamado por Tom Jobim pra gravar aquele disco Getz/Gilberto. Milton Banana, na bateria, também aparece nessa fita. Getz/Gilberto levou alguns Grammys (quatro milhões de discos, mais que os Beatles) e uma grana pra turma. Nem todos se deram bem.

Tião Neto, Tom Jobim, Stan Getz, João Gilberto e Milton Banana
(Livro - Bossa Nova - História Som e Imagem)

Após o famoso concerto de Bossa Nova no Carnegie Hall (Nova York), em novembro de1962, e a gravação do LP Getz/Gilberto, Tião Neto parte para a Europa com João Gilberto ao violão, João Donato ao piano e Milton Banana na bateria. Um time da pesada. Acho que nunca mais se formou um quarteto desse nível. O mais incrível é que eles não ensaiavam nada, saia tudo na hora. Também não precisava, era só um olhar para o outro e dar aquela risadinha sacana. Tião Neto deve ter passado um sufoco com esses três malucos circulando pela Europa

João Gilberto, João Donato, Milton Banana e Tião Neto
(Livro - Chega de Saudade)

Em 1963 vai para os EUA com Os Bossa Três. Toca lá naqueles inferninhos do jazz e cai no Ed Sullivan Show, aquele programa onde se apresentaram também os Beatles. Não sei se foi bom ou ruim. Em minha opinião, Edison Machado deve ter achado um saco. Era um programa de grande audiência, do tipo Silvio Santos no Brasil. Aparecia de tudo: mágico, ventrílogo, malabarista e até músicos. Aliás, domingo sempre foi o auge do brega na televisão no mundo todo.

Night Club Shelly's Manne Hole, Los Angeles.
Chico Batera, Barney Kessel, Bud Shank, Tião Neto e Sérgio Mendes.
(Livro - Bossa Nova - História Som e Imagem)

Em 1964 cai na estrada com o Sérgio Mendes Trio, agora com Chico Batera no seu instrumento original. Excursiona pela América do Norte, América do Sul e Japão. Com o trio grava “The Swinger From Brasil”. Um bom disco. Fizeram muito sucesso no México. Aliás, a Bossa Nova era idolatrada no México. Muita gente foi pra lá. E teve a Copa do Mundo de 70 com aquele timaço do Brasil que levou o Tri. Depois de São Paulo e Rio, Guadalajara foi o terceiro berço da Bossa Nova.

Em 1965 vai para Los Angeles (EUA), grava com um monte de gente e passa a tocar com Sérgio Mendes e o Brasil, 66, 77e 88. Deve ter curtido muito esse período. Sérgio Mendes tirava a maior onda nessa época com aquela música “Mas Que Nada” do Jorge Ben. E aquelas duas loiras lidíssimas de minissaia no vocal. Isso era o Brasil 66 de Sérgio Mendes. Dom Um, na batera, só na retaguarda curtindo o visual.

Chegaram a tocar em Washington, na Casa Branca, em 1974, para o presidente Nixon, e em 1978, para o presidente Reagan. O primeiro aí não saiu bem na fita. Sérgio Mendes deve ter ficado meio preocupado. Em 1979 e 1980 tocam no Carnegie Hall. Sucesso absoluto. Sérgio Mendes é realmente um fenômeno. Com certeza ele deve se lembrar do início de carreira quando saia de Niterói, pegava a barca da Cantareira pra atravessar a Baia de Guanabara e praticamente pagava para tocar no Beco das Garrafas com as feras. Foi um salto e tanto. Interessante, como Niterói dá bons músicos. Ainda vou escrever sobre isso.

Tião Neto nasceu no Rio de Janeiro, mas sua identificação é toda com Niterói. Acho que nasceu no Rio por acaso. Você sabia que Liv Ullmann, aquela sueca dos filmes de Igmar Bergman, nasceu no Japão? Pois é.

Tião Neto em Los Angeles com Sérgio Mendes e Dori Caymmi.
(Livro - Bossa Nova - História Som e Imagem)

Tião Neto rodou o mundo com o grupo de Sérgio Mendes (Brasil 66, 77 e 88) até 1982. Volta ao Brasil e monta um estúdio para gravação de gingles e campanhas comerciais. De vez em quando ainda saia com Sérgio Mendes para uma apresentação aqui outra ali.



Em 1984 é convidado por Tom Jobim para ingressar na Banda Nova que ele estava formando para tocar na Europa. Tom tinha sido convidado pelo maestro Peter Guth para se apresentar na Áustria com a Filarmônica de Viena. Acho que Tom sentiu o peso e chamou uns amigos e parentes para acompanhá-lo. Chegou Danilo Caymmi, Tião Neto, Paulo Braga, Paulo Jobim, Beth Jobim, Simone Caymmi e Ana Jobim. Mais tarde se incorporou ao grupo Maúcha Adnet, Paula e Jaques Morelembaum. Deu certo. Esse grupo rodou o mundo até a morte de Tom, em 1994. Em 1987 tocam no Japão. Em 1990 se apresentam no Lincoln Center, em Nova York. Em l992, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Em 1995, voltma a tocar no Carnegie Hall. Mais sucesso. Tom estava cheio das bossas e o grupo afinadíssimo.

Em 13 de junho de 2001, depois de lutar contra um câncer na bexiga, Tião Neto faleceu, aos 69 anos, na sua cidade querida, Niterói. A profissão de músico nem sempre é justa, mas o pessoal que toca contrabaixo sempre tem um semblante feliz, não sei por quê. Quase sempre são aqueles barbudinhos que ficam lá na cozinha segurando as derrapadas das estrelas e o delírio dos egos. Poucos chegam ao estrelato, nem ligam, mas nós, músicos, os reverenciamos e sabemos de sua importância. Nunca serão esquecidos.

Um abraço Tião.